Presidente do TJ reintegra Mesa Diretora da Câmara de Aracati suspeita de falcatruas
Vereadores haviam sido afastados após o Ministério Público impetrar na Justiça uma Ação Civil Pública para barrar o desvio de verbas públicas
Gladyson Pontes
09/06/18 10:43
O presidente do Tribunal de Justiça do Ceará, desembargador Francisco Glaydson Pontes, decidiu sozinho (decisão monocrática) reintegrar aos seus cargos os seis vereadores que compõem a mesa diretora da Câmara Municipal de Aracati. Eles haviam sido afastados da direção da Câmara por suspeitas de envolvimento em um esquema de desvio de verbas públicas, fato que deu origem à uma Aça Civil Pública impetrada pelo Ministério Público.
Em sua decisão, publicada nesta sexta-feira, o desembargador determina que sejam reintegrados à Mesa Diretora da Câmara os vereadores Valdy Ferreira de Menezes, Ricardo José de Oliveira, Andrei Moreno Freire, Maria Ilda de Souza, Luiz Carlos Solheiro e Jeanete Costa da Silva.
Para o desembargador, “não foram configurados os referidos indícios” de atos ilícitos ou irregulares que configurariam crimes ou atos de improbidade administrativa, nem “demonstração evidente de que os vereadores em questão estejam influenciando na instrução processual”, ressalta o magistrado. E mais, na sua argumentação, o presidente do TJCE alega ainda que, “com o aludido afastamento, diversos mandados de segurança foram impetrados em juízos distintos, resultando em decisões monocráticas contraditórias, que estariam gerando grave lesão à ordem pública administrativa, mormente, diante da percepção local acerca da ausência de comando do poder legislativo mirim”.
Com a decisão, os seis vereadores devem retornar à Mesa diretora da Câmara Municipal de Aracati nesta segunda-feira (11), mesmo estando todos sendo alvos de uma investigação do Ministério Pùblico.
Eles são suspeitos do cometimento de vários atos ilícitos. Em uma das denúncias,foi revelada uma enrolada entre o presidente da Casa, Valdy Menezes, e o primeiro-secretário, Ricardo Sales. O primeiro alugou carro para a Câmara da empresa do segundo, usando como “laranja” um funcionário de Ricardo. Além disso, o imóvel onde funciona a empresa que alugou o carro é o escritório do primeiro-secretário.
Os vereadores Valdy, Ilda, Ricardo e Andrei estão sendo investigados também por terem adulterado documento para beneficiar a Prefeitura de Aracati, segundo o Ministério Público. Também existe suspeita de superfaturamento em licitações.
Veja a decisão do desembargador sobre o fato:
Processo: 0624682-98.2018.8.06.0000 – Suspensão de Liminar ou Antecipação
de Tutela
Autor: Município do Aracati
Réus: Ministério Público do Estado do Ceará, Valdy Ferreira de Menezes,
Ricardo José de Oliveira, Andrei Moreno Freire, Maria Ilda de Souza, Luiz
Carlos Solheiro e Jeanete Costa da Silva
DECISÃO MONOCRÁTICA
Trata-se de pedido de suspensão de liminar requerido pelo
Município de Aracati, em face de de diversas decisões interlocutórias, que
iniciaram-se com o afastamento da Mesa Diretora da Câmara Municipal de
Aracati, proferido na ação civil pública nº 0014512-11.2018.8.06.0035, ajuizada
pelo Ministério Público do Estado do Ceará.
Alega o ente federativo, em síntese, que com o aludido
afastamento diversos mandados de segurança foram impetrados, em juízos
distintos, resultando em decisões monocráticas contraditórias, que estariam
gerando grave lesão à ordem pública administrativa, mormente diante da
percepção da comunidade local acerca da ausência de comando do poder
legislativo mirim.
Requer a imediata suspensão das liminares concedidas
pelos Juízos da 1ª e 2ª Varas da Comarca de Aracati, nos autos dos processos:
ACP nº 0014512-11.2018.8.06.0035/0; MS nº 0014580-58.2018.8.06.0035/0 e
no MS nº 00014269-67.2018.8.06.0035/0.
Às fls. 100/101, determinei a emenda da inicial, o que foi
devidamente atendido pela edilidade com a juntada da documentação de fls.
104/245.
É o breve relatório.
Para conferir o original, acesse o site http://esaj.tjce.jus.br/esaj, informe o processo 0624682-98.2018.8.06.0000 e código CB4EBE.
Este documento é cópia do original, assinado digitalmente por FRANCISCO GLADYSON PONTES, liberado nos autos em 08/06/2018 às 18:35 .
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Tribunal de Justiça do Estado do Ceará – Av. General Afonso Albuquerque Lima, S/N. – Cambeba CEP: 60830-120 – Fone: (85) 3207-7000
FUNDAMENTAÇÃO
O pedido de suspensão dirigido ao Presidente do Tribunal
de Justiça visa a sustação da eficácia da decisão de primeira instância, sem
implicar anulação ou reforma, razão porque não contém o efeito substitutivo,
próprio dos recursos. É, para alguns, verdadeiro juízo político exarado pelos
tribunais, a fim de estancar grave lesão à ordem, à saúde, à economia ou à
segurança públicas, quando verificado um mínimo de plausibilidade à tese
jurídica defendida pelo Poder Público, sem incursionar no mérito da ação
principal.
Na lição de LEONARDO CARNEIRO DA CUNHA, in A
Fazenda Pública em Juízo, 13 ed., Rio de Janeiro: Forense, 2016, p. 606/609,:
“A causa de pedir é a violação a um dos interesses
juridicamente protegidos previstos nas hipóteses de
cabimento já examinadas (segurança, saúde,
economia e ordem públicas). Esse é o mérito do
pedido de suspensão de segurança, o que o
distingue de um recurso. Rigorosamente, o pedido de
suspensão destina-se a tutelar interesse difuso.
[…]
Sem embargo de o presidente do tribunal, no exame
do pedido, não apreciar o mérito da demanda
originária, é preciso, para que se conceda a
suspensão, consoante firme entendimento do
Supremo Tribunal Federal, que haja um mínimo de
plausibilidade na tese da Fazenda Pública,
exatamente porque o pedido de suspensão funciona
como uma tutela provisória de contracautela” (grifo
nosso).
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No presente caso, no exercício desse juízo de
plausibilidade mínimo, encontro razões suficientes para determinar a concessão
do efeito suspensivo pleiteado no pedido de contracautela excepcional.
De fato, dispõe o parágrafo único do art. 20, da Lei nº
8.429/92 (Lei da Improbidade Administrativa)
“Art. 20. A perda da função pública e a suspensão
dos direitos políticos só se efetivam com o trânsito em
julgado da sentença condenatória.
Parágrafo único. A autoridade judicial ou
administrativa competente poderá determinar o
afastamento do agente público do exercício do cargo,
emprego ou função, sem prejuízo da remuneração,
quando a medida se fizer necessária à instrução
processual”.
Revela a norma, portanto, que, considerado o princípio da
soberania popular, o afastamento do agente político do exercício do cargo é
medida excepcional e voltada exclusivamente à incolumidade da instrução
processual.
Nesse sentido, orienta o Superior Tribunal de Justiça:
“(…) o afastamento do prefeito deve se fundamentar
na comprovada necessidade de resguardar a
instrução processual, nos termos do art. 20, parágrafo
único, da Lei 8.429/1992. (…) Inocorrente a
necessidade concreta de resguardar a instrução
processual, configura-se a grave lesão à ordem
pública tutelada pela lei 8.437/1992.” (Trecho de
decisão monocrática proferida pelo Ministro
Presidente do Superior Tribunal de Justiça
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FRANCISCO FALCÃO nos autos da SLS 2051/CE,
publicada em 06/08/2015).
“PEDIDO DE SUSPENSÃO DE MEDIDA LIMINAR E
DE SENTENÇA. AFASTAMENTO DE PREFEITO.
GRAVE LESÃO À ORDEM PÚBLICA. A sentença
que afasta de suas funções o titular de mandato
eletivo implica a cassação da vontade popular por
quem não tem competência para esse efeito – não
sendo, de resto, possível antecipar o afastamento
definitivo em razão de expressa disposição legal (L.
8.429/92, art. 20). Agravo regimental não provido.
(AgRg na SLS 1.620/PE, Rel. Ministro ARI
PARGENDLER, CORTE ESPECIAL, julgado em
29/08/2012, DJe 06/09/2012).
“SUSPENSÃO DE LIMINAR. PREFEITO.
IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. AFASTAMENTO
CAUTELAR. DECISÃO QUE NÃO SE PRENDE AO
ART. 20, PARÁGRAFO ÚNICO, DA LEI 8.429/92.
ILEGALIDADE. GRAVE LESÃO À ORDEM PÚBLICA
INSTITUCIONAL. 1. A Constituição Federal, quando
trata de independência e harmonia, sustenta o
delicado equilíbrio entre os Poderes da República. 2.
Este equilíbrio não exclui completamente a
possibilidade de que um dos Poderes interfira no
outro. Há, entretanto, previsão expressa – em Lei ou
na Constituição – dos casos em que essa intervenção
é legítima. 3. Em se tratando de improbidade
administrativa, só há uma hipótese tolerável de
intervenção do Poder Judiciário nos demais Poderes
para afastar agentes políticos: Art. 20, parágrafo
único, da Lei 8.429/92. 4. Vale dizer: a gravidade dos
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ilícitos imputados ao agente político e mesmo a
existência de robustos indícios contra ele não
autorizam o afastamento cautelar, exatamente porque
não é essa a previsão legal. 5. A decisão que
determina o afastamento cautelar do agente político
por fundamento distinto daquele previsto no Art. 20,
parágrafo único, da Lei 8.429/92, revela indevida
interferência do Poder Judiciário em outro Poder,
rompendo o delicado equilíbrio institucional tutelado
pela Constituição. 6. Surge, então, grave lesão à
ordem pública institucional, reparável por meio dos
pedidos de suspensão de decisão judicial (Arts. 4º da
Lei 4.348/64, 12, § 1º, da Lei 7.347/85, 25, caput, da
Lei 8.038/90 e 4º da Lei 8.437/92). 7. Para que seja
lícito e legítimo o afastamento cautelar com base no
Art. 20, parágrafo único, da Lei 8.429/92, não bastam
simples ilações, conjecturas ou presunções. Cabe ao
juiz indicar, com precisão e baseado em provas, de
que forma – direta ou indireta – a instrução processual
foi tumultuada pelo agente político que se pretende
afastar.” (AgRg na SLS 857/RJ, Rel. Ministro
HUMBERTO GOMES DE BARROS, CORTE
ESPECIAL, julgado em 29/05/2008, DJe 01/07/2008,
REPDJe 14/08/2008).
In casu, entendo não configurados os referidos indícios,
faltando ao decisum impugnado demonstração evidente de que os vereadores
em questão estejam influenciando na instrução processual.
Quanto as demais questões, é bom que se evidencie que
pertencem à orbita dos assuntos interna corporis. Como bem esclarece
LOPES MEIRELLES, Dmunicipal brasileiro. São Paulo: Malheiros, 1998, p. 461:
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“Interna corporis são somente aquelas questões ou
assuntos que entendem direta e exclusivamente com
a economia interna da corporação legislativa, com
suas prerrogativas institucionais ou com a faculdade
de valorar matéria de sua privativa competência. Tais
são os atos de composição da Mesa, de apreciação
da conduta de seus membros e de julgamento das
infrações político-administrativas do prefeito, de
formação da lei e de manifestação sobre veto. Daí
não se conclua, porém, que tais assuntos afastam
por completo a revisão judicial. Não é assim. O que a
Justiça não pode é substituir a deliberação da
Câmara por um pronunciamento de mérito do Poder
Judiciário. Não se pode olvidar, todavia, que os
interna corporis são atos formalmente administrativos
e materialmente políticos. Na sua tramitação e forma
ficam sujeitos ao exame judicial, como os demais
atos; na valoração de seu conteúdo refogem da
censura do Judiciário.”
DISPOSITIVO
Diante do exposto, DEFIRO o pedido suspensivo das
decisões proferidas nos processos ACP nº 0014512-11.2018.8.06.0035/0; MS
nº 0014580-58.2018.8.06.0035/0 e no MS nº 00014269-67.2018.8.06.0035/0.
Oficie-se, com URGÊNCIA, ao juízo de origem.
Expedientes necessários.
Fortaleza, 8 de junho de 2018.
Desembargador FRANCISCO GLADYSON PONTES
Presidente do TJCE
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