OABCE acusa juiz de humilhar advogada durante audiência de disputa de guarda

Profissional afirmou que o magistrado teria abusado da burocracia e contribuído para a morte de uma criança de quatro anos. Para juiz, a advogada não estaria qualificada para a profissão

Fórum Clóvis Beviláqua, onde se localiza a 2ª Vara da Família da Comarca de Fortaleza

26/02/18 16:00

A Ordem dos Advogados do Brasil no Ceará (OAB-CE) acusou o juiz titular da 2ª Vara da Família da Comarca de Fortalea, Joaquim Solón Mota Júnior, de ter humilhado e constrangido humilhado a advogada Sabrina Veras durante uma audiência de um processo para decidir sobre a guarda de duas crianças. Sabrina afirmou que a morosidade do magistrado no processo teria custado a vida de uma das crianças.

A advogada, que representava o pai das duas garotas, protocolou, em novembro de 2017, um pedido de tutela de urgência na Vara para que o pai assumisse a guarda das crianças. Uma das meninas, de quatro anos, afirmava estar apanhando da mãe, que morava no Interior do Estado, e sofria com problemas de saúde. O pai queria a guarda para trazer as filhas para Fortaleza, onde teriam melhor aparado de saúde.

Sabrina afirma ter tentado várias vezes ser ouvida por Joaquim Solón na tentativa de dar celeridade ao caso, no entanto as iniciativas sempre foram barradas pela assessoria do magistrado. A situação chegou ao ápice quando, em janeiro de 2018, a criança morreu. A advogada então entrou em contato com a Vara e foi atendida pela substituta de Joaquim Solón, que estava de férias. A magistrada prontamente concedeu a guarda da outra criança ao pai.

Diante da decisão e da morte da menina, Sabrina levou a história a público afirmando que a equipe da 2ª Vara da Família teria “matado” a garota por usar burocracia para se omitir de dar sequência ao caso. O juiz Joaquim Solón decidiu, então, durante a audiência, realizada na última quarta-feira (21), constrangeu a advogada ao afirmar que ela seria “desqualificada” para o trabalho por ter se emocionado ao relembrar o dia da morte da criança.

O magistrado ainda atribuiu às ações de Sabrina à “sua imaturidade e pouca vivência”, afirmando que a advogada ficaria devendo favor “às doutoras” por não levar o caso à polícia. Sabrina gravou a audiência e levou à OAB-CE, que saiu em defesa da advogada, gerando uma guerra de notas entre a entidade e a Associação Cearense de Magistrados.

Embate OAB-CE e ACM

A Ordem, em nota de repúdio, ressaltou que a Constituição Federal prevê o direito de acesso ao judiciário e afirmou que a advogada foi censurada pelo magistrado, que a agiu de forma “desrespeitosa e constrangedora”. A entidade acionará o Conselho Nacional de Justiça e a Corregedoria do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará sobre o ocorrido.

“A Constituição Federal prevê o direito de acesso ao Judiciário, bem como a necessidade da advocacia para a defesa do jurisdicionado. As ofensas proferidas pelo magistrado procuraram desqualificar o trabalho desenvolvido pela advogada, visando intimidá-la para ocultar a ausência de agilidade da análise de pedidos de tutela jurisdicional de urgência, que permaneceram inertes na Secretaria da Vara, a propósito da morosidade desta”.

Já a ACM manifestou apoio a Joaquim Solón e repudiou a postura da OAB-CE, que estaria realizando uma “campanha acusatória e difamatória” contra o magistrado. “A entidade esclarece que o fato noticiado envolve advogada descontente com o trâmite processual legal, tratando-se de circunstância inaceitável, uma vez que afronta a independência judicial da magistratura, principalmente quando atinge diretamente um juiz que, em 2017, teve produtividade bem acima da média nacional”.

Confira o áudio:

Confira as notas lançadas pelas entidades:

Nota de Repúdio da OAB-CE

A Ordem dos Advogados do Brasil – Secção Ceará, por meio de seu Conselho Seccional, repudia a atitude desrespeitosa e constrangedora do magistrado Joaquim Solón Mota Junior, da 2ª Vara de Família da Comarca de Fortaleza, que agrediu com termos ofensivos uma advogada no exercício de sua profissão, na tarde da última quarta-feira (21).
A Constituição Federal prevê o direito de acesso ao Judiciário, bem como a necessidade da advocacia para a defesa do jurisdicionado. As ofensas proferidas pelo magistrado procuraram desqualificar o trabalho desenvolvido pela advogada, visando intimidá-la para ocultar a ausência de agilidade da análise de pedidos de tutela jurisdicional de urgência, que permaneceram inertes na Secretaria da Vara, a propósito da morosidade desta.

A advogada foi censurada pelo magistrado perante as partes do processo em que atuava e, posteriormente, diante de advogados e membros da Defensoria Pública, após a realização de audiência. Uma situação constrangedora não só para ela, mas para todos os operadores do direito presentes. Uma afronta às prerrogativas advocatícias e falta de zelo do magistrado pelo Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, já que, como pôde ser conferido em áudio gravado pela advogada, a postura do juiz foi, de fato, vergonhosa.

A OAB atua e continuará a atuar na defesa intransigente das prerrogativas da advocacia, baseada no diálogo e no bom senso, em homenagem à inexistência de hierarquia ou subordinação entre advogados, magistrados e membros do Ministério Público, devendo todos tratarem-se com consideração e respeito recíprocos. Desta forma, não se esquivará de adotar as medidas judiciais e/ou administrativas necessárias para garantir o livre exercício profissional.

O mesmo se estende à garantia de que nenhum membro da advocacia seja constrangido por conta de sua atuação profissional em defesa dos interesses de seus constituintes, concretizando assim o Acesso à Justiça.

A OAB Ceará afirma, ainda, que está requerendo providências junto ao Conselho Nacional de Justiça e à Corregedoria do Tribunal de Justiça do Estado no sentido de apurar os fatos e tomar medidas por justiça e coação de novas afrontas aos advogados cearenses.

Nota de apoio da ACM ao magistrado

A Associação Cearense de Magistrados (ACM) manifesta apoio ao juiz da 2ª Vara de Família da Comarca de Fortaleza, Joaquim Solón Mota Junior; ao tempo em que repudia, veementemente, a conduta da Ordem dos Advogados do Brasil – Secção Ceará (OAB-CE), que divulgou nota pública, em meio escrito e na mídia social, numa campanha acusatória e difamatória contra o mencionado magistrado.

A entidade esclarece que o fato noticiado envolve advogada descontente com o trâmite processual legal, tratando-se de circunstância inaceitável, uma vez que afronta a independência judicial da magistratura, principalmente quando atinge diretamente um juiz que, em 2017, teve produtividade bem acima da média nacional.

Ressalta-se que a gravação da conversa demonstra claramente que a advogada Sabrina Veras imputou aos servidores da unidade judiciária, de forma inconsequente, o falecimento de uma criança, o que ensejou a repreensão do magistrado.

É inadmissível tornar pública conversa que trata de um processo que corre em segredo de justiça, violando a própria lei.

Por fim, a ACM ratifica sua postura de defesa aguerrida do livre trabalho dos juízes e da autonomia judicial, como primordiais à missão da magistratura de aplicar as leis e entregar justiça à sociedade.

Fortaleza, 24 de fevereiro de 2018

Ricardo Alexandre da Silva Costa
Presidente da Associação Cearense de Magistrados (ACM)

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